sexta-feira, 18 de novembro de 2022

MANIFESTAÇÕS DEMOCRÁTICAS, AINDA QUE NÃO DEMOCRÁTICAS

                Intitular movimentos sociais de antidemocráticos requer muito mais do que a generalização atualmente adotada pela imprensa como um todo. A legitimidade das manifestações passa pela prévia comunicação à autoridade competente, afim de garantir a preferência do local e a preservação da segurança, bem como “sem armas”, expressão do artigo 5º. XVI da Constituição Federal.

                Não há que se falar em caráter antidemocrático em se tratando de manifestação que cumpra os requisitos traçados para o direito de reunião, a livre manifestação do pensamento e o direito de ir e vir, todos consagrados princípios constitucionais.



                Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal já considerou constitucional a “Marcha da Maconha” que, em que pese reivindicar a legalização de uma droga, obedeceu aos critérios estabelecidos para que a “marcha” atendesse aos preceitos acima descritos, ou seja, os manifestantes apenas reivindicavam algo que hoje é ilegal, mas que pretendem que no futuro não seja.  Logicamente que se algum dos manifestantes fizesse uso da droga ou comercializasse ali em meio ao ato, teria que ser recolhido por cometimento de crimes descritos no Código Penal.

                A título de exemplo, seria perfeitamente possível que houvesse um ato em prol da liberação do aborto no Brasil, desde que o ato fosse previamente comunicado à autoridade competente, resguardando o local da passeata, bem como a segurança dos participantes e do trânsito daquele local.

                Pensar em direitos fundamentais exige sempre um exercício de análise concreta de conflito entre os direitos que envolvem a questão, a fim de que prevaleçam os direitos fundamentais que naquele caso sejam preponderantes, não implicando isso em atribuir genericamente a eles uma força maior perante os demais.

                Assim, o fechamento de rodovias caracteriza a necessidade de sopesar a liberdade de locomoção e a livre manifestação de pensamento e, nesse ponto em específico, resta evidente que deva prevalecer o direito de ir e vir, uma vez que este implica necessariamente no abastecimento da população como um todo.

                Mas diferente disso, a concentração de pessoas defronte quartéis manifestando indignação com o resultado das eleições e mesmo que pedindo “intervenção militar” ou “intervenção federal” – ambos institutos incabíveis aos anseios pretendidos – não fere quaisquer outros direitos fundamentais que pudessem tornar o ato inconstitucional.  Pensar diferente disso seria impedir o exercício democrático de um direito que é pilar da Democracia e que simbolicamente representou a ruptura com o período militar.

                Desta forma, não há que se falar que o movimento em si é antidemocrático, uma vez que atende ao que preceitua a Constituição e, em que pese, a reivindicação não seja legítima por inexistir previsão nesse sentido, isso por si só não soa como antidemocrático visto que surte efeito somente entre os próprios manifestantes, expressa indignação e não caracteriza um movimento armado – o qual seria vedado.

                O amadurecimento político de um povo passa, primeiro pela educação sobre política nas escolas – o que não ocorre no país - e, segundo, pelo engajamento em movimentos ou instituições que sejam partícipes diretos do processo democrático, ainda que seja às custas de reivindicações não pautadas nas ordens jurídicas legislativa e constitucional.

sexta-feira, 4 de novembro de 2022

BOLSONARO PODE SE NEGAR A PASSAR A FAIXA PRESIDENCIAL?

 


  Como sabemos, as atribuições de um Presidente da República são várias, principalmente por acumular as funções de chefias de Estado e de Governo em nosso presidencialismo, todas previstas no artigo 84 da Constituição Federal, sendo certo que dentre outras, as atribuições passam por edição de medidas provisórias, decreto de estado de sítio, nomeação de ministros etc.

    Com o andamento do processo de transição de governo ocorrendo normalmente, fica a dúvida a respeito da passagem de Faixa presidencial, isso porque o atual Presidente Jair Bolsonaro havia declarado que só a faria se as eleições ocorressem de forma "limpa", mas, ao longo de todo pleito questionou desde a confiabilidade das urnas eletrônicas até a atuação do Tribunal Superior Eleitoral, o que indica sua insatisfação com o pleito em que saiu derrotado.

    De outro lado, Lula será diplomado até dia 19 de dezembro pelo TSE, ocasião em que terá em mãos o instrumento que lhe credencia oficialmente para a posse em 1o. de janeiro de 2023, atestando a validade do pleito e o declarando apto a ocupar o cargo de Presidente da República.

    A posse efetivamente ocorre através de uma formalidade prevista no Decreto 70.274/72, o qual prevê toda cerimônia de passagem da faixa presidencial, inclusive dizendo que o Presidente da República "seja recebido, à porta principal do Palácio do Planalto, pelo Presidente cujo mandato findou" e "após os cumprimentos, ambos os Presidentes, acompanhados pelos Vice-Presidentes Chefes do Gabinete Militar e Chefes do Gabinete Civil, se encaminharão para o Gabinete Presidencial, e dali para o local onde o Presidente da República receberá de seu antecessor a Faixa presidencial. Em seguida, o Presidente da República conduzirá o ex-Presidente até a porta principal do Palácio do Planalto", prevê o decreto.

    Mas seria essa uma obrigação imposta a Bolsonaro?  Há previsão de punição em caso de não cumprimento?

    A resposta é negativa, não há obrigação e nem mesmo punição.  Por se tratar de uma cerimônia de posse, a qual ocorrerá entre forças políticas de lados diferentes, o próprio decreto prevê que caberá ao Vice-Presidente da República do mandato findo, a passagem da Faixa em caso de recusa do Presidente que sai, ou seja, caberá a Hamilton Mourão a condução de todo cerimonial na ausência de Jair Bolsonaro.

    Não se trata de uma situação inusitada na política brasileira, uma vez que o último presidente da era militar João Figueiredo, em 1985, recusou-se a passar a Faixa para José Sarney, então Vice-Presidente - que tomou posse em razão da internação de Tancredo Neves - tendo sido conduzido ao cargo sem a presença do Presidente cujo mandato se findava.

    Após esse episódio em 1985 todos os Presidentes seguintes cumpriram as formalidades previstas no Decreto de 1972.

    Importante acrescentar que, apesar do Decreto prever que o Vice-Presidente da República conduzirá a cerimônia na ausência do Presidente, a linha de ocupação do cargo de Presidente, em seguida ao Vice, é preenchida pelo Presidente da Câmara dos Deputados, Presidente do Senado Federal e Presidente do Supremo Tribunal Federal, respectivamente.  Assim, na ausência de Hamilton Mourão, caberá a Arthur Lira a passagem da Faixa a Lula.

    A posse é um ato importante que inaugura um novo mandato presidencial, cercada de formalismos, juramento no Congresso Nacional, contato com o povo, passagem pelas Forças Armadas, mas, em que pese o simbolismo da passagem de Faixa, em nada penaliza a ausência do Presidente da República do mandato findo e nem mesmo impede que essa ocorra de outras formas.

    A expectativa gerada por eleitores de ambos os lados reside na apertada disputa eleitoral e na ideologia divergente de ambos os lados, mas em nada impede a ocorrência da posse.

Henrique Morgado Casseb, analista político, advogado, professor e doutor em Direito Constitucional

quarta-feira, 25 de março de 2020

PRONUNCIAMENTO E ISOLAMENTO POLÍTICO

A pandemia está aí, para todos os países enfrentarem e no caso do Brasil, podemos dizer que se trata de uma prova com gabarito pronto, bastando preencher e entregar, isto porque países da Ásia e Europa já passaram pela situação e seus erros e acertos já são conhecidos, bastando identificá-los e aplicá-los. Mas o que parece simples não o é!
Saúde é uma questão econômica e por essa razão não somos o mundo, somos o Brasil, com todas as peculiaridades.

quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

LULA, O STF E A INSEGURANÇA JURÍDICA

E várias dúvidas são levantadas às vésperas de uma eleição das mais complexas que o Brasil já viveu desde a redemocratização em 1988. Digo isso em razão não só do impeachment da ex-Presidente Dilma - o qual, por si só ocasionaria uma turbulência eleitoral - mas muito mais significativamente pelas denúncias e condenações que assolam a alta cúpula política do país.
O eleitor se vê confuso por vários motivos, mas especialmente pelo não conhecimento dos trâmites legais de um processo judicial.  É fato também que até o eleitor mais bem informado juridicamente está confuso e a insegurança jurídica vem do próprio Judiciário!
Fico imaginando ter que explicar a um estrangeiro tudo que estamos vivendo hoje.  Tarefa que deixaremos aos historiadores, pois a nós, hoje, cabe a angustiante tarefa de esperar decisões da Justiça.

sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

Eleições Indiretas no Brasil? Sim, senhor...



A considerar a situação atual do país, a qual possui um Presidente da República sem vice e a pendência de ação judicial no Tribunal Superior Eleitoral, e cujo desfecho pode levar à cassação da chapa eleitoral que levou à vitória Dilma Roussef - Michel Temer, é possível considerar que a remota possibilidade de eleição indireta no Brasil possa vir a ocorrer.
                Apesar do voto direto figurar como cláusula pétrea, a eleição indireta pelo Congresso Nacional é prevista no artigo 81, parágrafo primeiro da Constituição Federal para a hipótese de abertura de vacância do cargo de Presidente da República nos dois últimos anos de mandato.

quinta-feira, 12 de maio de 2016

QUEM CRIOU O IMPEACHMENT DE DILMA?



                É fato que o afastamento da presidente Dilma coloca um ponto final a um capítulo de nossa História política, haja vista se tratar de um governo de esquerda cujos ideais socialistas sempre fizeram parte de um discurso a favor da ética e da desigualdade social.
                Esse ponto final se deve ao fato de que, sem governo, não há como o Partido dos Trabalhadores promover a arte de convencimento em favor da absolvição da presidente no seu futuro julgamento político pelo Senado.  Até lá, o governo de Michel Temer já estará, bem ou mal, instituído e atuante.

terça-feira, 19 de janeiro de 2016

SILÊNCIO NO TÁXI



                Não é novidade que o serviço Uber representou uma pedra no sapato dos taxistas, isto porque, a prestação de serviço criou um padrão de atendimento através de um aplicativo e com preços consideravelmente mais atrativos.
                Nossa discussão aqui é outra!
                A pretexto de estimular uma concorrência leal entre os motoristas de táxi e de Uber, foi aprovada uma lei em São Paulo que proíbe, sim, proíbe que se converse dentro dos táxis sobre política, religião, futebol e assuntos ligados à categoria profissional dos motoristas ou problemas pessoais, a fim de não gerar estresse ao passageiro.

quinta-feira, 2 de julho de 2015

POR QUE A DISCUSSÃO SOBRE A REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL É INCONSTITUCIONAL?

A discussão acerca da maioridade penal se tornou latente nos últimos meses dentro e fora do Congresso Nacional.
Sabemos não se tratar de uma discussão fácil de se fazer em razão de prós e contras de um assunto tão delicado que envolve menores de idade e crimes (hediondos ou não).
Aqui nesse espaço não pretende discutir esses prós e contras, nem mesmo a constitucionalidade ou não da redução sob o prisma material.
A ideia é mais simples: a discussão sobre maioridade penal é inconstitucional sob o aspecto procedimental.  Explico!

sábado, 6 de junho de 2015

CONFLITO FORÇADO DA LIBERDADE DE RELIGIÃO E O CHEIRO DO PRECONCEITO

 
Você usaria uma camiseta escrito "Sou Evangélico" sendo católico ou vice-versa?
  Mas você respeitaria aquele que usasse tal camiseta por ter uma escolha religiosa diferente da sua?
  Pois bem, a rede Boticário lançou uma campanha pela qual apresenta seus produtos com foco no dia dos namorados através de imagens de casais "convencionais" e gays.
  A reação foi imediata nas redes sociais com a iniciativa de um boicote ao produtos da rede e muitas mensagens de críticas e, ao mesmo tempo, de apoio à campanha.
  Mas porquê a rede lançou uma campanha dessa?

quinta-feira, 28 de maio de 2015

FIM DA REELEIÇÃO NO PODER EXECUTIVO: É SUFICIENTE?

A Câmara dos Deputados aprovou o fim da reeleição para cargos do Poder Executivo (prefeitos, governadores e Presidente) e extirpou um dos maiores males da história política brasileira.
A reeleição mostrou que a máquina pública tem um poder quase indestrutível no processo eleitoral, já que cerca de 85% dos candidatos à reeleição são reeleitos.