Como sabemos, as atribuições de um Presidente da República
são várias, principalmente por acumular as funções de chefias de Estado e de
Governo em nosso presidencialismo, todas previstas no artigo 84 da Constituição
Federal, sendo certo que dentre outras, as atribuições passam por edição de
medidas provisórias, decreto de estado de sítio, nomeação de ministros etc.
Com o andamento do processo de transição de governo
ocorrendo normalmente, fica a dúvida a respeito da passagem de Faixa
presidencial, isso porque o atual Presidente Jair Bolsonaro havia declarado que
só a faria se as eleições ocorressem de forma "limpa", mas, ao longo
de todo pleito questionou desde a confiabilidade das urnas eletrônicas até a
atuação do Tribunal Superior Eleitoral, o que indica sua insatisfação com o
pleito em que saiu derrotado.
De outro lado, Lula será diplomado até dia 19 de
dezembro pelo TSE, ocasião em que terá em mãos o instrumento que lhe credencia
oficialmente para a posse em 1o. de janeiro de 2023, atestando a validade do
pleito e o declarando apto a ocupar o cargo de Presidente da República.
A posse efetivamente ocorre através de uma
formalidade prevista no Decreto 70.274/72, o qual prevê toda cerimônia de
passagem da faixa presidencial, inclusive dizendo que o Presidente da República
"seja recebido, à porta principal do Palácio do Planalto, pelo Presidente
cujo mandato findou" e "após os cumprimentos, ambos os Presidentes,
acompanhados pelos Vice-Presidentes Chefes do Gabinete Militar e Chefes do
Gabinete Civil, se encaminharão para o Gabinete Presidencial, e dali para o
local onde o Presidente da República receberá de seu antecessor a Faixa
presidencial. Em seguida, o Presidente da República conduzirá o ex-Presidente
até a porta principal do Palácio do Planalto", prevê o decreto.
Mas seria essa uma obrigação imposta a
Bolsonaro? Há previsão de punição em caso de não cumprimento?
A resposta é negativa, não há obrigação e nem mesmo
punição. Por se tratar de uma cerimônia de posse, a qual ocorrerá entre
forças políticas de lados diferentes, o próprio decreto prevê que caberá ao
Vice-Presidente da República do mandato findo, a passagem da Faixa em caso de
recusa do Presidente que sai, ou seja, caberá a Hamilton Mourão a condução de
todo cerimonial na ausência de Jair Bolsonaro.
Não se trata de uma situação inusitada na política
brasileira, uma vez que o último presidente da era militar João Figueiredo, em
1985, recusou-se a passar a Faixa para José Sarney, então Vice-Presidente - que
tomou posse em razão da internação de Tancredo Neves - tendo sido conduzido ao
cargo sem a presença do Presidente cujo mandato se findava.
Após esse episódio em 1985 todos os Presidentes
seguintes cumpriram as formalidades previstas no Decreto de 1972.
Importante acrescentar que, apesar do Decreto prever
que o Vice-Presidente da República conduzirá a cerimônia na ausência do
Presidente, a linha de ocupação do cargo de Presidente, em seguida ao Vice, é
preenchida pelo Presidente da Câmara dos Deputados, Presidente do Senado
Federal e Presidente do Supremo Tribunal Federal, respectivamente. Assim,
na ausência de Hamilton Mourão, caberá a Arthur Lira a passagem da Faixa a
Lula.
A posse é um ato importante que inaugura um novo
mandato presidencial, cercada de formalismos, juramento no Congresso Nacional,
contato com o povo, passagem pelas Forças Armadas, mas, em que pese o
simbolismo da passagem de Faixa, em nada penaliza a ausência do Presidente da
República do mandato findo e nem mesmo impede que essa ocorra de outras formas.
A expectativa gerada por eleitores de ambos os lados
reside na apertada disputa eleitoral e na ideologia divergente de ambos os
lados, mas em nada impede a ocorrência da posse.
Henrique Morgado Casseb,
analista político, advogado, professor e doutor em Direito Constitucional
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